31 de dezembro de 2010

Último dia de quê?

Olá amigos do P & M, andamos um pouco ausentes, mas blogueiro também tira férias, estamos vindo com força total em 2011.

Hoje acordei com o estrondo de um foguetão, certamente disparado por algum cidadão mais eufórico com a passagem do ano. Como de costume levantei, joguei um charme para mim mesmo ao passar pelo espelho do quarto (sem essa de narcisismo), adentrei o toalete e fui ler o jornal (online é claro), aqui cabe um parêntese além do parêntese, é exatamente neste ambiente íntimo e perfumado e em outro nem tão íntimo e muito menos perfumado que todos os seres ditos humanos tornam-se absolutamente iguais, que eu chamo filosoficamente de "a alquimia do S duplo": o sanitário e a sepultura.

Após a breve reflexão escatológica, sentei-me ao sofá e meus olhos semi-cerrados buscaram a estante, e logo ali na prateleira central, a esquerda, abaixo do panteão dos poetas e ao lado do areópago dos metafísicos, estava aquele espaço que toda estante que se preze possui, a prateleira onde repousam os bibelôs de quermesse, os berloques que pertenceram a vovó falecida, os biscuits insossos de porcelana paraguaia, cristais tchecos que eram o xodó do pai austríaco e toda a sorte de badulaques e bugigangas. Particularmente na minha notam-se apenas três objetos: O "Rodolfo", um crânio de estimação que ganhei a muitos anos de um velho amigo que à época era estudante de medicina, ao lado direito do "Dôfinho", como carinhosamente o chamo, está uma ampulheta em plena atividade, que um outro amigo me trouxe como souvenir do templo de Cronos na velha Cólquida, já ao lado sinistro repousa um galo, daqueles que mudam de cor conforme o clima, cafonérrimo, esse aí deve ter vindo do SAARA.

Três símbolos perfeitos no dia perfeito para uma breve, porém profunda reflexão sobre o tempo e o nosso papel dentro dele. Será que este rito de passagem é apenas uma folha e um ano a menos no calendário e na existência? Existir ou não existir, eis a ilusão.

A morte, o tempo e aquele que anuncia o novo incansavelmente. As eras não mudam, as únicas coisas passíveis de mudanças reais são pensamentos, palavras e principalmente atitudes, um processo interno e solitário, que não depende de regimes políticos, religiões e filosofias, depende apenas da vontade individual numa mente firme, somente dessa maneira podemos mudar um ano, uma década, um século e até fazer de verdade uma "nova era". No fundo somos velhos hippies, buscando sempre de alguma forma a Paz e o Amor, e vez em quando ingerindo algo com algum grau de toxidade para que a existência pareça mais leve e suportável.

Dizia um verso de uma canção infantil quando eu era adolescente: "depende de nós se esse mundo ainda tem jeito", uma das coisas mais certas que já ouvi em meus 46 anos de Terra. É preciso se perder a mania de taxar tudo que pode ser de utópico, tenho certeza que não estamos aqui inventando os mais diversos passatempos enquanto a morte não chega, ou dando uma de Carolina e vendo o tempo passar da janela, estamos aqui para sermos como o galo, arautos de um Novo Tempo, que vale muito mais que 1.000 réveillons.

Por hora nos resta curtir "Age of Aquarius", e que tenhamos uma boa entrada e uma melhor saída.

HAPPY NEW YEAR!!!

Por Mario Medella

14 de dezembro de 2010

Tereza de Jesus, mãe de Martinho da Vila

Martinho da Vila escreveu as memórias de sua mãe, Teresa de Jesus.

Na obra, a matriarca, já no outro lado da vida, mas ainda preocupada com parentes e aderentes, narra a saga da família Ferreira desde o ponto mais remoto que sua memória consegue alcançar, para, com isso, mostrar aos seus um caminho, fornecer um exemplo, traçar uma linha que torne mais clara a caminhada de cada um. Um roteiro.

Memórias de Teresa, poderia ser chamada esta obra. Teresa viveu mudanças radicais em sua vida, a partir da infância em Duas Barras, igual à de milhares de teresas negras e pobres do Brasil.

O primeiro rito de passagem foi o momento em que a casa grande da fazenda dos patrões se abriu para acolher o nascimento do único filho homem – predestinação, quem sabe?

– ela que, antes daquele parto e depois dele, só pariu meninas. E no casebre de chão de terra.

Em busca de oportunidades para o filho Martinho, o meieiro Josué Ferreira largou de ser o respeitado “Josué das Letras” e impôs à família o segundo rito: mudaram de Duas Barras para o Rio de Janeiro, cidade que o engoliu e deixou Teresa viúva com cinco filhos para criar.

Finalmente, a terceira e mais brusca das mudanças: com o sucesso do filho, Teresa passou a ser a grande senhora daquelas terras, a matriarca de uma dinastia gerada no seu próprio ventre.

Quanta matéria de análise se depreende desses fatos... e tudo a partir do nascimento do filho de Teresa, Martinho José, gerado com a missão de fazê-la escalar todos os degraus da pirâmide social, da base ao topo, ao seu lado, sempre, consciente ele de que para ficar solidamente de pé, uma árvore não pode se afastar jamais da raiz, sua referência primeira.

Primeira lição: parece que, no Brasil, mobilidade social é possível. Tomara!

Segunda: estimular a auto-estima. Para isso, só carinho de mãe para fornecer aos filhos as informações que a escola e o sistema dissimulam.

Vejam bem: como é que um país co-colonizado por africanos e afro-descendentes não os revela em sua história oficial? Adoniram Barbosa dizia que negro não gostava de ir a museus porque nessas instituições só eram retratados como escravos.

Onde estão os heróis negros, além do mítico Zumbi?

Onde foi a bravura do marinheiro João Cândido?

Onde a erudição do padre José Maurício Nunes Garcia?

E por que o negro Calabar foi chamado de traidor - acaso não podia escolher de que lado ficava, se tanto o holandês quanto o português, invasores, almejavam apenas dominar a terra dele?

Como mostrar a sucessivas gerações de pele cor de chocolate que sua tarefa na construção desta terra foi muito maior do que a de servir ao “senhor” de descendência européia?

Contar que trouxeram de diferentes regiões da África experiências laborativas, espirituais e afetivas para enriquecer o dia-a-dia do solo brasileiro. Que, ao se misturarem com índios e europeus, ajudaram a criar uma civilização multirracial, única no mundo, cuja capacidade criativa está muito além de jogar futebol e fazer samba?!

A terceira lição mostra as conseqüências do “holocausto” africano, pois além de trazê-los à força, dizimando famílias, tribos, nações, os portugueses submetiam-nos a uma verdadeira lavagem cerebral, destruindo-lhes a família, ao separar pais e filhos, irmãos; enterrando deuses, proibindo crenças e substituindo-as por outra, estranha, branca, silenciosa, tão diferente do toque dos atabaques, da dança dos orixás, dos “gungunar” dos pretos-velhos.

Após a abolição, foi preciso apelar para a teoria dos arquétipos e através deles reconquistar a família perdida no navio negreiro ou nas fazendas de cana, ouro ou café. No matriarcado da macumba e do sonho, redescobriram as “tias”, as “mães”, o compadrismo. Paulo Benjamin de Oliveira, fundador da Escola de Samba da Portela, era padrinho das filhas de Antonio Caetano, outro fundador, que batizou a filha do tesoureiro Rufino, que era compadre de Cláudio Bernardo da Costa, o sócio nº 1: assim, os fundadores da Portela viraram uma família só. Quem, no morro da Mangueira, não era sobrinho da Tia Neuma e da Tia Zica, ou neto da Vó Maria Joana Rezadeira do Império Serrano?

Sábia Mãe Tereza...você não queria que seus filhos e netos sentissem dores e carências. Por isso deixou tudo explicadinho: quem ficou em Duas Barras, quem casou com quem, quem foi pra São Paulo, quem descasou, quem ficou famoso, quem morreu.

Teresa fortaleza, que manteve um controle tão grande sobre a própria vida, que no momento que se sentiu pesada, incapaz de movimentar-se sozinha, cedendo ao peso dos anos, deixou de se alimentar e foi ficando leve, muito leve, até flutuar como uma pluma e subir aos céus. E bem no momento em que seu filho querido se encontrava longe, em terras portuguesas, fazendo sucesso. Só para ele sofrer menos!

Mãe Teresa, a tarefa está completa. Você deu a todos a vida. Mas deu, também, uma história. A mais bela de todas, que é a história de cada um. Hoje, a família está mais rica do que antes. Porque, por meio do seu relato seguro e carinhoso, ela se tornou dona do maior de todos os tesouros: o seu passado. A sua história.

Teresa da roça, Teresa incansável, Tereza mulher, mãe, avó, amiga, companheira, Teresa múltipla, Teresa pluma. Agora, você pode descansar em paz, ao lado de Jesus, seu e nosso Senhor.

Você deixou o roteiro. Agora, a gente já sabe como iniciar o resgate!


Marilia Trindade Barboza

13 de dezembro de 2010

30 anos sem Lennon

Há 30 anos morria assassinado o cara que pediu uma chance à paz, que imaginou um mundo mais humano, um mundo sem disputas de qualquer espécie, onde a única Religião seria o Amor, não esse "amor" que ouvimos a todo instante nas canções água com açucar que nos são impostas pela grande mídia com a clara intenção de imbecilizar o povo, mas a resistência está aí, obras consistentes com grande conteúdo, vibram e vibrarão por muitos e muitos séculos, amenizando nossas duras existências e combatendo a mediocridade autômata, obras como a de John por exemplo.

Vale a pena ler o texto do Vinicius do "Pilha na Vitrola" e conferir os lançamentos em homenagem à este verdadeiro ídolo pop não fabricado que foi, é e será o nosso John Lennon.


Mario Medella


Músico em excelência e músicas de excelência. Podem ser tratados assim tanto o cantor, guitarrista, pianista e compositor John Lennon, como suas canções.

Se fosse vivo, teria completado 70 anos em 9 de outubro, e sabe-se lá quantas pérolas mais não teria produzido. Sua obra, relançada agora em belíssimas edições e ainda desconhecida por muitos, vai além dos indiscutivelmente fantásticos álbuns gravados ao lado de Paul McCartney, George Harrison e Ringo Starr.

Com o fim dos Beatles, anunciado por McCartney em 1970, Lennon, que já havia produzido os discos Two Virgins, Life With The Lions, Wedding Álbum, além do ao vivo Live Peace in Toronto, ainda nos anos 1960 (estes não fazem parte do pacote de relançamentos) mergulhou, ao lado de Yoko Ono, na carreira solo.

Com comemoração mundial, a obra do músico britânico cuja voz há mais de 40 anos cantou e lutou pela paz no mundo, está disponível em uma caixa batizada John Lennon Signature (EMI Records, R$ 1.000 em média), importada no mercado brasileiro.

A caixa traz, além dos oito discos de estúdio, dois outros álbuns (Home Tapes e Singles) com gravações caseiras inéditas e singles, além de um livro com textos escritos por Yoko Ono, Sean Lennon e Julian Lennon especialmente para a edição comemorativa. Os discos foram remasterizados a partir das fitas originais e supervisionados pessoalmente por Yoko, que tratou de dar mais ênfase à voz do cantor e deixar a sua própria (quando canta junto) com menos destaque. [pg] Para quem não pretende desembolsar muito dinheiro, há outra opção. Os títulos John Lennon/Plastic Ono Band, Imagine, Some Time in New York City, Mind Games, Walls and Bridges, Rock 'N' Roll, Double Fantasy/Stripped Down e Milk and Honey também podem ser adquiridos separadamente (estes sim, lançados no mercado brasileiro) e custam em média R$ 34,90 cada, com exceção do duplo Double Fantasy/Stripped Down (R$ 54 em média). Lançados em formato digipack, os discos contêm livreto com informação adicional, letras e fotos.

Estão disponíveis também duas compilações. A primeira, Gimme Some Truth (R$ 160 em média), traz quatro CDs. Na lista de canções estão Instant Karma! (We All Shine On), Steel And Glass, Mind Games e uma versão ao vivo para Yer Blues. No total são 72 composições.

A segunda é Power to the People: The Hits (R$ 39,90 em média). Entre as músicas escolhidas estão além da faixa homônima, Gimme Some Truth, Woman, Imagine, Give Peace a Chance e Jealous Guy. Há uma versão do álbum que traz também um DVD (R$ 59 em média) com 15 vídeos, entre eles, Whatever Gets You Thru the Night, Mind Games, Stand By Me e #9 Dream, por exemplo.

Se a sugestão é comemorar e relembrar a música de John, como a própria Yoko disse. "Acorde ouvindo a voz de John. Aproveite. Dance com ela em seu coração. Mantenha John perto de você. Ele ama você". Então, chegou a chance.


Por Vinicius Castelli


Blog Pilha na Vitrola

Marvio & Tom

Marvio Ciribelli recebe o saxofonista americano Tom Bergeron.

Na próxima Quinta Feira, dia 16 de Dezembro, o Armazém da Música será novamente Internacional e nele, o pianista Marvio Ciribelli estará recebendo o saxofonista americano Tom Bergeron num show de jazz, bossa nova e choro. Além de ser um jazzista consagrado que tocou até com a cantora Ella Fitzgerald, Tom se especializou no Choro e, o toca de uma forma que surpreende, com muita técnica e suingue brasileiro.


Tom Bergeron, músico atuante no cenário internacional e autoridade mundial em "Multifonia"

Em quase 50 anos de carreira, o saxofonista Tom Bergeron tem atuado pelos Estados Unidos, Europa e Costa Rica, se apresentando com artistas renomados internacionalmente, como Ella Fitzgerald, Hal Blaine, Anthony Braxton, Rosemary Clooney, Natalie Cole, Robert Cray, Williams Mason, Florin Myron, Vinnie Golia, Dick Hyman, Oliver Lake, Glen Moore, Bernadette Peters, Bobby Mostrai, The Fifth Dimension, The Temptations, Sunny Turner, Lynn Anderson, Royal Guy Lombardo canadenses e febre Marin Alsop String.


Tom Bergeron também é uma das maiores autoridades do mundo em multifonia, a técnica esotérica de produzir várias notas de só uma vez num saxofone. Ele também é professor de música da Western Oregon University, nos Estados Unidos.


No Repertório da Noite, além de "Jazz Standards" como Cherokee (Ray Noble), St. Thomas (Sonny Rollins), Tune Up (Miles Davis); Straight, no Chaser (Thelonious Monk); Stella by Starlight (Victor Young) e Well You Needn't (Thelonious Monk), Tom e Marvio vão apresentar choros como Assanhado (Jacob do Bandolim), Apanhei-te Cavaquinho (Ernesto Nazareth) e Tico Tico no Fubá (Zequinha de Abreu) e bossas como Amor em Paz (Jobim e Vinícius) e Retrato em Branco e Preto (Chico Buarque).

Serviço:

Marvio Ciribelli recebe o saxofonista americano Tom Bergeron

Data: 16 de Dezembro (Quinta Feira) Hora: 21h Local: Velho Armazém Endereço: Praia de São Francisco, nº 6, Niterói-RJ Tels: (21) 2714-5424 / 2704-9547 Couvert: R$ 18,00 Classificação Etária: Livre Capacidade: 80 lugares Cartões: Todos

1 de dezembro de 2010

Um samba inédito para uma saudade antiga


Em meu aniversário de 16 anos, a exatos 30 anos, morria o velho e genial Angenor de Oliveira, o Cartola, que com sua imensa alma repleta de poesia, inundou o mundo com belas melodias e letras impecáveis, deixando um pouco mais leve nossa fastidigiosa existência humana.

A festa rolava frouxa, meus amigos embalados pela disco music, Bee Gees, Donna Summer, Village People e outros bichos, quando meu avô apareceu na sala e me chamou num canto, larguei as mixagens mirabolantes e fui até lá, ele disse: Cartola morreu..., sabendo da minha profunda admiração pelo ícone da Verde e Rosa. Olhei fixamente o quadro ao lado, uma paisagem noturna, toda em tons de azul, pintada por meu tio médico, que entre uma cirurgia e outra era metido a Renoir. Não titubiei, fui até o meu quarto, peguei um bolachão do Angenor e sapequei na estroboscópica Techinics, que parecia girar em rotação de angústia, "nunca mais RPM". Acho que vocês sabem o que aconteceu, levei uma vaia categórica, não importa, desloquei meu olhar pelo janelão do avarandado e fui dar com Vesper, que ainda brilhava imponente ao lado de Selene (a lua), nesse momento preciso, de total contrição, murmurei: perdoa Cartola, eles não sabem o que fazem. E depois de correr e olhar o céu, disfarçei e chorei, não haviam rosas pra me consolar, mesmo porque de nada adiantaria, elas não falam mesmo. Empunhei o microfone e bradei aos quatro cantos do velho AP tijucano: Cartola morreu, no disco tocava: "em Mangueira quando morre um poeta todos choram/vivo tranquilo em Mangueira porque, sei que alguém há de chorar quando eu morrer...". Lá no fundo da discoteca improvisada, um gaiato gritou: "quem é esse cara!" Imediatamente respondi no mesmo tom: "ainda bem que não é o seu pai!".

A festa se apagou nos trâmites oníricos da história, mas as formidáveis canções do Mestre da Mangueira estão aí, e ficarão por aí pelos séculos e séculos Amém. E é por essas e outras que quando li o excelente artigo da Marília, publicado aqui no blog, na coluna "Prosa Carioca", tive vontade de fazer um samba para registrar essa data, un samba de exaltação e saudade, e assim foi, reli mais umas 17 vezes o precioso artigo da Marília e parti sem piedade para o meu "estúdio de empregada", saindo de lá somente quando o samba estava todo alinhavado.

Como eu queria publicá-lo no blog exatamente no dia 30 de novembro, dia dos 30 anos de sua morte e dos meus 46 anos de vida, a gravação não saiu como deveria, e aqueles que sacam do negócio sabem o que eu estou falando. A correria foi grande. Faz partitura, vai na ECM, manda pra editora, fala com músicos amigos, monta imagens para o vídeo, e isto tudo sem perturbar os afazeres profissionais e domésticos deste pentatleta que vos fala.

O samba está aí, podem baixar, tocar, ouvir, e principalmente reverenciar o nosso Angenor.

Voz e violão: Mario André

Piano: Heitor Brandão

Percussão: Maurício Barbosa

Mixagem: Erik Brandão

Para realizar o download, clique no link a seguir:
[30 anos - Saravá Cartola]


Por Mario Medella