20 de outubro de 2010

Por onde andará Jarbas Falópio?

Por mais absurdo que seja, houve um tempo em que a turma do Boteco da Farani acompanhava em peso as desventuras de uma novela. Se não me falha a memória, isso foi lá pelos idos de 1982. Bem, na realidade era uma radionovela. E sua narrativa era discutida entre copos e mais copos de cerveja em todos os cantos do bar pelos alunos de Comunicação da Facha.

Produção da mitológica rádio Fluminense FM, a Maldita, a inusitada novela, totalmente underground, tinha um anti-galã chamado Jarbas Falópio. E o grande barato começava a partir daí, pois se dizia que o narrador Falópio era mais do que um mero personagem. Segundo a lenda, o cara realmente existia.

O nosso herói se arrastava em frangalhos pelas ruas da cidade, abraçado a uma garrafa de vodka, em busca da felicidade. Creio, essa era a espinha dorsal da trama. Amante da boa música, Falópio tinha como trilha sonora de sua tragicômica vida peças de Arrigo Barnabé, Rumo, Beatles, Nélson Cavaquinho, Ramones, Noel Rosa, e por aí vai.

O astro da Maldita não tinha a maldade de uma Odete Roitman nem a bondade dos dalits globais, mas tinha o charme de um galã às avessas. Digamos, um Tom Waits tupiniquim. Acusado de reacionário, afogado no álcool e outros ingredientes, o moribundo anti-herói sucumbiu no tempo e no espaço junto com a antológica Fluminense. Ninguém sabe propriamente como acabou aquela historia, mas isso é mero detalhe.

O inegável é que as narrações de Falópio marcaram e influenciaram uma geração de jornalistas. Bem, antes que haja protestos dos intelectuais de plantão, pelo menos a turma do Boteco da Farani ficou marcada.

Enfim, todo esse relato é para anunciar que o imponderável aconteceu dia desses. Caminhava eu pelo calçadão de Copacabana quando me sentei para apreciar o mar no banco monumental de Drummond. Quando cheguei já havia um cidadão sentado ali, à direita. Camisa social, óculos fundo de garrafa, cabelo engomadinho com gel e um jurássico walkman nos ouvidos.

Pediu-me um cigarro, acendi um paiero e estendi para ele. E logo puxou um papo interessantíssimo que ia do samba de raiz ao rock progressivo. Lá pelas tantas descobri que a figura era nada mais nada menos que Jarbas Falópio. Não era lenda, o cara realmente existe. E mais, é um dos meus novos consultores musicais. Pudera, a viagem sonora do sujeito é tão louca quanto a novela radiofônica da saudosa Fluminense.

Ali mesmo, naquela hora, ele ouvia a única parceria dos cúmplices Jards Macalé e Moreira da Silva. Contou-me que “Tira os óculos e recolhe o homem” narra um episódio verídico ocorrido com os dois na década de 70, quando Macalé foi enquadrado num quarto de hotel em Vitória (ES), sendo levado para uma delegacia. Melhor do que contar é ouvir o samba de breque de Macalé e Kid Moringueira, crônica publicável nos melhores pasquins da cidade.


Manto Costa


[Tira os óculos e recolhe o homem - Jards Macalé, Moreira da Silva]

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